Direito Tributário Empresarial

É o presente para arquivar, e a quem interessar tornar disponível, algumas divagações no campo do Direito Tributário Empresarial, da Filosofia e outras áreas afins. Lauro Arthur G. S. Ribeiro - Advogado, Professor Substituto (UFPR - 2005/2006) Correções, críticas, sugestões: lauro.r@gmail.com

segunda-feira, outubro 18, 2004

Ordem Econômica e Tributação na Constituição Federal de 1988


Introdução
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Dois fenômenos do mundo científico, ocorridos em uma quase simultaneidade histórica, retratados em cortes epistemológicos em planos científicos maiores, determinaram, de um lado, o estudo e consideração da imposição e cobrança de tributos como relação jurídica, marco histórico do Direito Tributário – nas palavras de Sainz de Bujanda - e não como uma relação de poder - este o primeiro fenômeno, Alemanha, 1919 com a edição do Reichsabgabenordnung - ao mesmo tempo em que o Estado passou a reconhecer – como verifica Eros Grau - a necessidade de um sistema de direção do processo econômico ordenado pelo Estado - segundo fenômeno, Rússia, 1921, com o GOSPLAN.
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Ambos os fenômenos espraiaram seus princípios por diversos sistemas jurídicos, restando adotados como importantes ferramentas para a realização de direitos da Ordem Econômica e dos respectivos sistemas tributários que são, principalmente no ocidente, culturalmente transnacionais.
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A livre concorrência ordenada é exemplo clássico do momento pós contemporâneo do cruzamento de ambos os institutos no âmbito da globalização, já que a OMC – Organização Mundial do Comércio - veda a adoção de subsídios (tributários inclusive) que malfiram uma ordem econômica agora internacional (ou transnacional, para utilizar do mesmo termo).
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Na leitura de todas as obras citadas na bibliografia do presente trabalho, em nenhuma delas se atentaram os juristas para a quase simultaneidade de nascimento dos institutos sob comento, bem como para o fato de que a existência da relação jurídico tributária, apesar de hoje ser encarada como intrínseca (e indissociável) a uma ordem econômica, na verdade, histórica e justificadamente, a precede.
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Já na divagação sobre os aspectos históricos da breve monografia que ora se apresenta vemos que os ordenamentos constitucionais tributários brasileiros foram e hoje ainda são, em regra, tratados de maneira extravagante às respectivas ordens econômicas, ou pouco se relacionando com elas, o que parece ser um equívoco quando confrontamos os efeitos da tributação na economia propriamente dita.
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O resultado disso é a hipótese, constitucionalmente possível no presente momento em que o Supremo Tribunal Federal tolera interpretações mais elásticas do poder de legislar em matéria tributária, de se buscar programaticamente a livre iniciativa, ao mesmo tempo em que com fundamento na mesma constituição se a limita ou anula (a livre iniciativa) por tributos.
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Tal limitação, em seus efeitos práticos, ou em outras palavras, no plano de eficácia do texto constitucional, implica na eventual negação completa de alguns preceitos da Ordem Econômica por força da suposta legítima aplicação de presumidamente válida imposição legal tributária.
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Enfim, depois de analisado o aspecto histórico e seus reflexos no sistema jurídico vigente, ingressar-se-á propriamente nos caracteres da Ordem Econômica e do Sistema Tributário na forma como estão em nossa atual Constituição Federal, demonstrando sua inafastável integração, ao mesmo tempo em que se fará longo e pertinente arrazoado sobre a vinculação da libertinagem tributária estatal (desvinculação de receitas, violação à ética tributária, etc.) a seus desastrosos efeitos econômicos.
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1. Da Ordem Econômica e sua indissociabilidade da tributação
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A quase exauriente análise de Direito Constitucional de J.J. Gomes Caotilho é um suposto em qualquer trabalho de real caráter científico nesta seara.
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Daí porque a necessidade de tratar-se o tema, primeiramente sob o enfoque da identificação dos objetos (Ordem Econômica e tributação e seus respectivos princípios) e seu eidos, traço comum (ponto em que são indissociáveis), que permita tratá-los coerentemente dentro de um sistema filosófico das relações do sujeito (intérprete) com os objetos como ensejadoras da busca de uma verdade própria ao fim de concluir-se algo em relação aos mesmos.
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Assim, e em ordem a estabelecer uma tipologia dos princípios constitucionais, o consagrado mestre Canotilho, sob ângulo amplo e considerando o todo constitucional, considera as seguintes quatro espécies como existentes:
os "Princípios jurídicos fundamentais (Rechttsgrundsätze)", que são considerados "os princípios historicamente objectivados e progressivamente introduzidos na consciência jurídica e que encontram uma recepção expressa ou implícita no texto constitucional." Exemplo desta citada espécie é o "princípio da publicidade dos actos públicos (...) princípio da proibição de excesso (...) princípio do acesso ao direito e aos tribunais" e o "princípio da imparcialidade da administração";
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os "Princípios políticos constitucionalmente conformadores", que são os "princípios constitucionais que explicitam as valorações políticas fundamentais do legislador constituinte. Nestes princípios de condensam as opções políticas nucleares e se reflecte a ideologia inspiradora da constituição." São exemplos deste específico tipo os "princípios definidores da forma de Estado: princípios da organização econômico-social, como, por ex:, o princípio da subordinação do poder econômico ao poder político democrático, o princípio da coexistência dos diversos setores da propriedade – público, privado e cooperativo – (...) os princípios estruturantes do regime político (princípio do Estado de Direito, princípio democrático, princípio republicano, princípio pluralista) e os princípios caracterizadores da forma de governo e da organização política em geral.";
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os "Princípios constitucionais impositivos" que podem ser caracterizados como sendo "os princípios que, sobretudo no âmbito da constituição dirigente , impõe aos órgãos do Estado, sobretudo ao legislador, a realização de fins e a execução de tarefas." Como exemplo podemos citar "o princípio da independência nacional e o princípio da correcção das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento (arts. 9.º /d e 81.º /b). Traçam, sobretudo para o legislador, linhas rectrizes de sua atividade política e legislativa."; e,
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os "Princípios garantia" que em resumo são aqueles que "visam instituir directa e imediatamente uma garantia aos cidadãos. É-lhes atribuída uma densidade de autêntica norma jurídica e uma força determinante, positiva e negativa. Refiram-se a título de exemplo, o princípio de nullum crimen sine lege e de nulla poena sine lege (cfr. Art. 29.º), o princípio do juiz natural (cfr. Art. 32.º /7), os princípios de non bis in idem e in dubio pro reo (cfr. Arts. 29.º /4, 32.º /2)". A característica, o traço fundamental dos mesmos, é de que estes "traduzem-se no estabelecimento directo de garantias para os cidadãos e daí os autores lhes chamem ‘princípios em forma de norma jurídica’ (LARENZ) e considerem o legislador estreitamente vinculado na sua aplicação."

A citação da tipologia supra, desde já é necessário dizer, busca a provocação do raciocínio da possibilidade de não uniformidade do tipo do princípio quando analisado determinado preceito constitucional em face dos diferentes subsistemas jurídico-constitucionais. Em outras palavras quer-se afirmar que um princípio, como o republicano (art. 1º da CF), que é um princípio político constitucionalmente conformador resta, após confrontado em face do Sistema Tributário Nacional, como regra e garantia consubstanciada no direito à isonomia (jurídica), então repetido no art. 150, II da CF.
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Esta imbricação dos princípios é verificada na doutrina de Roque Carrazza:
"A lei tributária deve ser igual para todos e a todos deve ser aplicada com igualdade. Melhor expondo, quem está na mesma situação jurídica deve receber o mesmo tratamento tributário. Será inconstitucional – por burla ao princípio republicano e ao da isonomia – a lei tributária que selecione pessoas, para submetê-las a regras peculiares, que não alcançam outras, ocupantes de idênticas posições jurídicas"

Em outras palavras, pode-se deduzir uma tipologia, na forma pretendida por Canotilho nesta passagem, analisando-se de forma abstraída (contexto gramatical puro) um determinado texto constitucional. Nada obsta - acredito que mesmo em face da maneira e limites colocados pelo mui digno autor português - que se desloque a identificação, dentro dessa tipologia, de um determinado texto constitucional quando se confronta este com uma situação do mundo fenomênico em que de fato outra interpretação não existe que não a da existência de um comando, o chamado "princípio em forma de norma".
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Em hipótese, portanto, conceber a possibilidade de a Secretaria da Receita Federal, em face de uma isenção geral concedida por lei, poder estabelecer a esta (lei) critérios restritivos subjetivos através de "instruções normativas" nada mais é do que, antes de negar a isonomia (entre os iguais desta hipotética lei), negar a república e reconhecer ao responsável pela edição do regulamento competência equivalente a de um tirano para legislar, impor comandos e estabelecer obrigações.
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Essa breve divagação sobre a tipologia proposta por Canotilho e sua flexibilização faz-se necessária quando mais adiante estudar-se-á a indissociabilidade propriamente dita da tributação (e todos os seus princípios) da Ordem Econômica constitucional brasileira vigente..

Feitas estas primeiras considerações parte-se para a análise dos princípios propriamente ditos, e seu contexto científico ideológico.
Na atual Constituição, fruto da retomada da democracia e promulgada em 1988, a Ordem Econômica tem seus ditames preestabelecidos no Título VII.
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O artigo 170 da Constituição, primeiro deste título, estabelece os princípios da Ordem Econômica, nos seguintes termos:
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Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
I - soberania nacional;
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.
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A simples leitura o artigo já traz em si claramente a programaticidade dos princípios quando analisados em face de uma predictiva Ordem Econômica que restou almejada pelo constituinte.
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Mas antes é de se observar a relativização dogmático-científica destes princípios.
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Digno de registro por toda doutrina é o temperamento dos princípios da Ordem Econômica, já que se não pode tomar em termos absolutos, por exemplo, entre outros, o princípio da livre iniciativa, sob pena de retrocesso histórico ao liberalismo puro que tão caro preço cobrou das sociedades em que de maneira pouco pensada foi adotado.
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Sobre o assunto assim leciona o Prof. Dr. Diogo de Figueiredo Moreira Neto:
"O princípio da liberdade de iniciativa tempera-se pela da iniciativa suplementar do Estado; o princípio da liberdade de empresa, corrige-se com o da definição da função social da empresa; o princípio da liberdade de lucro, bem como o da liberdade de competição, moderam-se com o da repressão do poder econômico; o princípio da liberdade de contratação limita-se pela aplicação dos princípios de valorização do trabalho e da harmonia e solidariedade entre as categorias sociais de produção; e, finalmente, o princípio da propriedade privada, restringe-se com o princípio da função social da propriedade."
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Seguido a esse temperamento temos, ainda, os caracteres ideológicos que informaram o texto constitucional, observando José Afonso da Silva, de maneira pertinente, que "não aqui, como no mundo ocidental em geral, a ordem econômica consubstanciada na Constituição não é senão uma forma econômica capitalista, porque ela se apoia inteiramente na apropriação privada dos meios de produção e na iniciativa privada (art. 170)".
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Note-se que esse viés ideológico da apropriação privada dos meios de produção pela iniciativa privada teve maior contundência após a promulgação da Constituição de 1988, já que somente em 15/08/1995 através da EC 08 de houve a flexibilização do monopólio das telecomunicações e em 09/11/1995 através da EC 09 houve a quebra do monopólio do petróleo e gás natural. Além desses dois nichos de mercado houve a quebra de monopólios menores, mas não menos importantes, como o da navegação de cabotagem (que na verdade foi uma abertura de mercado) e da distribuição de gás canalizado pelos estados.
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Esse contexto de abertura de mercado e redução de monopólios indica o desejo de um ambiente de livre competição, típico do capitalismo.
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Daí porque podemos afirmar, em síntese bastante para esse tópico, que temos no Brasil uma Ordem Econômica capitalista, limitada ao fundamento de valorização do trabalho humano e que tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.
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Aqui já se torna evidente a colisão entre os princípios da Ordem Econômica e alguns comandos constitucionais de tez financeiro tributária, como por exemplo o desvio, através da DRU - Desvinculação das Receitas da União - de verbas públicas afetadas a determinações específicas (sociais sem qualquer sobra de dúvida) e que deveriam restar aplicadas de modo a cumprir a sua função de valorizar o trabalho humano e assegurar a todos existência digna.
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Pergunte-se ao motorista de caminhão parado, com uma ponta de eixo quebrada, na época das chuvas, entre Pontes e Lacerda (MT) e Vilhena (RO), se sua existência é digna e se seu trabalho está sendo valorizado quando é obrigado a entrar dentro dos buracos da estrada, com água até os joelhos para tentar consertar seu veículo, depois de ter pago os impostos embutidos no combustível que serviriam exatamente para tapar aquela "armadilha" de meio de caminho que o governo deliberadamente deixa de "desarmar".
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Daí porque se afirma, já no presente ponto desse estudo, que a indissociabilidade da tributação da Ordem Econômica está, em grande parte, associada ao fato de que ao negar-se vigência aos princípios do Sistema Tributário Nacional, inclusive por disposições inconstitucionais constantes dentro da própria Constituição, como a DRU supra, que retira recurso dos reparos das estradas, está-se literalmente abandonando no plano fático, como acima citado, Rondônia e Acre, através de seu desligamento da malha rodoviária, inviabilizando, por completo, a existência da aplicação dos princípios de uma Ordem Econômica constitucionalmente prevista para estes estados da federação, já que sequer podem imaginar poder serem iguais em direitos.
O Direito Tributário brasileiro, enquanto sistema jurídico, tem por característica peculiar a previsão em Constituição, de maneira minuciosa, de sua estrutura.
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Naquilo que diz respeito especificamente aos princípios temos que estes se encontram de maneira menos concentrada, textualmente, na seara tributária, em comparação com disposto no art. 170 da CF que diz respeito aos princípios da Ordem Econômica.
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A leitura do art. 150 da Constituição Federal (que não é o cerne único a ditar princípios do Sistema Tributário) deixa claros os motivos de tal verificação no detalhamento da matéria, levado às minúcias, e que impede, de fato, que se dê concisão única topológica ao texto constitucional.
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Por força desta específica peculiaridade – o minucioso tratamento jurídico de seus conceitos - a dogmática na esfera do Direito Tributário brasileiro hoje encontra-se razoavelmente desenvolvida sob o foco científico.
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Tal desenvolvimento, porém, não garante ao Sistema Tributário constitucionalmente previsto prestígio no meio social, por força da dissociação desse subsistema jurídico do que fora desejado pelo constituinte como um todo e, em especial - nas palavras de James Marins – "à política fiscal no que se refere a incorporação indispensável de conceitos jurídicos que devem informar as formulações político-econômicas e suas extraordinárias conseqüências jurídicas e, portanto, sociais".
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O que ocorre é exatamente inverso ao que deveria ser já que os conceitos jurídicos que se incorporam informam as formulações político-econômicas de modo a inviabilizar (conseqüência jurídica das formulações) o exercício de várias atividades econômicas.
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Quer-se dizer com isso que, vistas as conseqüências sociais, deduz-se, por esse ângulo, que o sistema tributário não se vem prestando a de maneira integrada aos demais ditames constitucionais perseguir qualquer bem comum.
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E tal relação entre os princípios tributários e uma realidade econômica são confirmados a doutrina de Fritz Neumark.
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"Son aplicables a todos los "sectores" de la economia financiera pública de un país (tal vez incluso al sector parafiscal) y com independencia del grado de desarrollo económico, o bien su ámbito de aplicación debe limitarse por una u outra consideración?
Estrechamete relacionada com la naturaleza de los principios de la imposición se nos apresenta la cuestión de los fines a los que puede o debe servir el establecimiento de unos princpipios de la imposición
(...)algunos de estos pricipios persiguen la salvaguarda de intereses espefificamente fiscales, otros tratan de asegurar, al menos primariamente, los derechos de los contribuyentes,cualquiera que sea su justificación, y finalmente un tercer grupo es de naturaleza político-económica.(g.n.)"

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Solicitando uma divagação ainda mais profunda sobre o tema prossegue James Marins sobre o assunto:
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"Por outro modo de dizer, é possível afirmar que sem filosofia tributária não se produz conceitos adequados de política fiscal e de política jurídico-fiscal o que não contribui para o aperfeiçoamento da legislação, o que, finalmente, desprestigia a ciência jurídica, obrigada a trabalhar com uma matéria prima legislativa univocamente tida como caótica por sensível ausência de cimento filosófico, o que deságua em uma tumultuada foz social."
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À toda evidência nosso Sistema Tributário, de dogmática tão apurada e cientificamente evoluído, vem sendo malferido de modo a amoldar-se aos mais injustificados fins. Diz-se injustificado pois, por exemplo, a Desvinculação das Receitas, a serem aplicadas onde bem entender o governo, nada mais significa no silogismo inverso em aplicar em algum lugar não desejado pelo povo que, em um sistema de democracia representativa, votou e aprovou um orçamento.
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Com tais colocações e fundamentos entendo ter posto os elementos necessários sobre os princípios tributários e sob o foco de suas relações com os princípios da Ordem Econômica, de modo a viabilizar, mais adiante, a clara demonstração da indissociabilidade de ambas.
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Sobre a indissociabilidade é claro o autor:
"(...)En lo que sigue analizaremos unos postulados de imposición que afectan al proceso económico, concretamente a la estabilidad – aproximada – de las macromagnitudes más importantes: valor monetario (nivel de precios) y empleo, por una parte, y – relativamente – creciente y "satisfactorio" crecimiento económico, por outra. Que la política fiscal puede e debe preocuparse por la realización de estos dos objetivos es algo que la teoria financiera no reconoció hasta hace aproximadamente una generación y la politica financiera hasta 1946 ("Employment Act" de los Estados Unidos)."

É nos fins da existência de um Sistema Tributário que Fritz Neumark identifica a vinculação da Ordem Econômica à tributação. Tratarei de alguns deles de modo a, sem esgotar o assunto nele próprio, o que implicaria em redigir algo com uma profundidade não desejada pela presente monografia, trazer ao presente breve estudo hipóteses que indicam a necessária indissociabilidade de uma Ordem Econômica de seu respectivo Sistema Tributário.
É necessário, segundo o autor, que se busquem medidas fiscais relevantes para a política de estruturas, e cita o exemplo de redistribuição fiscal de rendas e de patrimônio.
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Nesse ponto os efeitos práticos no Brasil deixam clara a inversão dos efeitos estruturais desejados pelo constituinte de 1988, causada pelos equívocos de desvirtuamento do Sistema Tributário Nacional.
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Passados dezesseis anos da promulgação da Constituição Federal pouco ou nada se fez em termos de efetiva utilização dos meios fiscais para que se redistribuisse a renda historicamente concentrada nas mãos de poucos.
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Depois da leitura de alguns vários autores para a realização do presente trabalho, outra não é minha conclusão que não a deriva da nau tributária nacional que vive errante e sem sequer vislumbrar como destino a redistribuição da renda ou qualquer dos princípios constitucionais, entre eles os da Ordem Econômica.
O autor considera, ainda, o sistema tributário integrado à política de estabilização econômica de curto e médio prazo, aí incluída a política de emprego, bem como a política de crescimento, esta de longo prazo. Quer ele significar que existe um planejamento a ser cumprido e que o fator tributário é tratado inerentemente ao planejamento. Tal assertiva é absolutamente lógica na exata medida em que para o atingimento dos objetivos financeiros de curto, médio e longo prazo, necessários a suportar o todo planejado, outro não seria a atitude que não considerar um montante (possível) a ser arrecadado.
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Trazendo essa assertiva à realidade brasileira teríamos que não existe o cumprimento de qualquer planejamento, já que os sucessivos aumentos de impostos de maneira desvinculada a um novo projeto de governo, servindo simplesmente para cobrir déficts, somente vem a denotar a situação de descontrole das finanças públicas e a impossibilidade de se propor um novo "contrato social" (para citar um instituto de Hobbes) para cumprimento de um suposto planejamento.
Em verdade o mui digno professor da PUC-PR escreveu sobre Política Fiscal. Mas o texto resta focado indiscutivelmente na realidade fiscal-econômica pelo que útil ao fim de dar respostas ao problema da indissociabilidade da Ordem Econômica da tributação nas Constituições Brasileiras.
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Diz o Prof. Dr. James Marins, em seu artigo Política Jurídico-Fiscal:
"A tributação opera no entorno econômico do indivíduo (microeconomia) mas também – e principalmente - de toda sociedade, já que influencia decisivamente a política de preços, de empregos e a balança comercial (macroeconomia).
As manifestações do fenômeno tributário se infiltram nos mais elementares fatos e negócios da vida privada ou das relações com o Governo. O fluxo de riquezas, internamente considerado ou na relação entre estados soberanos, também se vê profundamente atingido por medidas tributárias. A chamada extrafiscalidade é um poderoso agente regulador utilizado pela política econômica. As opções políticas fiscais também interferem na distribuição de riqueza interna e podem favorecer ou bloquear determinadas atividades, drenar recursos de uma para outra atividade econômica, estabelecer subsídios tributários ou barreiras tarifárias. Promover investimentos públicos aqui ou acolá. A tributação é fenômeno hiperestático, privado e público, individual e coletivo, microeconômico e macroeconômico, sociológico e ético, político e jurídico."

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Tais considerações levam ao inafastável ponto de que os efeitos da tributação devem ser medidos, planejados e considerados sob o foco dos princípios constitucionais. Considerar a tributação como só mais um instrumento de descumprimento de arrecadação, desvinculada de suas funções sociais constitucionais nada mais é do que institucionalizar o retorno à situação de pagamento de tributos como uma relação de poder e não mais uma relação jurídico tributária onde se considera os limites legais e constitucionais para justificar a imposição.
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3. Conclusões
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A quem verifique um resultado final da eficácia dos princípios constitucionais do Sistema Tributário Nacional e da Ordem Econômica, de maneira integrada, (e outra não seria, empiricamente considerada a eficácia, já que no meio das ciências econômicas é absolutamente impossível dissociar a tributação da micro e macroeconomia) é de se perguntar se se pode falar em justiça tributária independente da expectativa de justiça de uma Ordem Econômica.
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Viu-se em Fritz Neumark que não existe um fim único – arrecadador - da tributação, e tal lição longe de ter sido aprendida no Brasil leva a exemplos bizarros de mal aplicação da função arrecadadora. Tomemos um dos exemplos ocorridos: a União federal "mera arrecadadora" da Cofins e da CSLL, cujos recursos são, em tese, destinados à Seguridade Social, sob a justificativa de "perda de arrecadação" provocada pela correção da tabela do imposto de renda aumentou a contribuição social sobre o lucro, na forma prevista pela Medida Provisória nº 22 de 08 de janeiro de 2002. Tal fato implicou na mais clara confissão de que a União não destina tais recursos ao INSS e isso nada mais é do que ignorar a existência de uma Constituição Federal. Essa é, na forma aqui provada, a situação de descaso tributário da União para com qualquer princípio, seja ele da Ordem Econômica ou mesmo tributário. Daí decorre a conclusão que no Brasil a única função do aparato tributário é arrecadar o maior valor possível para ser distribuído desvinculadamente (desviado das suas afetações legais) pelo Poder Executivo.
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No Brasil, em termos de "imposição tributária", acredito eu sinceramente seja incapaz o governo de planejar, programar ou "raciocinar" mais de ano, na forma preconizada por Fritz Neumark (quando fala de política de curto, médio e longo prazo) como inerente a uma política econômica. Daí decorre a conclusão que se há alguma política no Brasil essa é desconhecida da maioria e o pior, não é retratada em um orçamento, já que este não é cumprido por ter suas verbas desvinculadas.
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O Prof. Dr. James Marins trata dos efeitos de uma política fiscal equivocada e sua repercussão no meio econômico. Tem-se daí a explicação do desemprego, da situação da saúde pública, do caos na segurança pública, que vive na visão de alguns uma guerra civil não declarada, das universidades públicas que como trote no curso de engenharia adotam a reforma das suas instalações pelos calouros e a vergonhosa situação das estradas, na forma como dito e citado em tópico acima. Daí conclui-se que o Poder Executivo arrecada, utilizando como legitimação a própria Constituição Federal, mas nega vigência à mesma quando perquirido sobre suas responsabilidades em face da vinculação das receitas, do cumprimento das funções sociais constitucionais, e em especial quanto a sua obrigação para com a programaticidade dos Princípios da Ordem Econômica, que quando colocados em face do orçamento (lei específica a dar cumprimento à norma programática) deixam de ser programáticos e passam a ensejar a aplicação do art. 85 da CF.
Lauro arthur Guimarães de Sá Ribeiro - em 18 de outubro de 2004 (1ª versão)

1 Comments:

Anonymous Julia said...

Muito interessante e viável a apresentação e comparação com o descrito em nosso ordenamento em relação a nossa realidade economica, que produz consequências nas demais áreas da sociedade.
Excelente linguagem, citação, desenvolvimento lógico e exemplificação.
Parabéns pelo trabalho.

7:25 PM  

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